sábado, 25 de fevereiro de 2012

..:: Tão perto ::..


(Todos os personagens dessa história são fictícios)


I've spent so much time
Throwing rocks at your window
That I never even knocked on the front door

I walk by statues never even made one chip
But if I could leave a mark
On the monument of the heart
I just might lay myself down
For a little more than I had

The last day
The last day
The last day

Wait a time to spare these lies
We tell ourselves
These days have come and gone
But this time is sweeter than honey

""Por todo tempo eu estive olhando pela janela

Desejando alcançar o lado de fora

Meus dedos tocavam os vitrais coloridos imaginando se o mundo lá fora também era assim

Mas nunca ousei tocar o fecho e empurrar aquelas folhas

Por todo esse tempo eu estive olhando pela janela e nada fiz

Assim a vida passou...""

Eu me lembro que quando era pequena havia uma grande janela com grossas cortinas encardidas.

Ela janela ficava numa sala onde minha família guardava quinquilharias, móveis antigos, brinquedos usados, ferramentas que todos sabemos que talvez (ou nunca) um dia iremos precisar. Aquela era a sala dos fantasmas.

Eu gostava daquele canto da casa, na verdade ele acabou tornando-se um dos meus cantos favoritos.

Sempre que queria ler e queria um lugar sossegado para fazer isso eu levava meus livros para aquela sala e me sentava abaixo da janela, o lugar mais iluminado daquele lugar e ficava ali até que o sol houvesse se escondido demais a ponto de eu não conseguir enxergar mais nenhuma das letras nas páginas.

Geralmente quando estava ali eu lia em voz alta, gostava de fazer caras e bocas imaginando as feições dos personagens das histórias que povoavam minha infância.

Um belo dia ao chegar na sala me deparo com um vulto na janela e sinto meu coração saltar no peito. Do lado de fora havia um homem, provavelmente meu vizinho. Mas o que ele estaria fazendo ali?

Chamei, mas não obtive nenhuma resposta e então me aproximei, sentando-me em meu lugar sob a janela e começando minha leitura. Talvez ele estivesse apenas cuidando do jardim dele, afinal aquela janela dava para o jardim vizinho.

Eram quase sete horas quando terminei minha leitura, tão distraída que já havia me esquecido do vizinho, tão entretida em interpretar às frases e os personagens que esqueci do intruso na janela, afinal ele estava ali em meu mundo sem ser convidado.

Quando me levantei olhei para o pano em tons de azul escuro e roxo pelo pôr do sol apenas para ter certeza de que ele já havia se ido e realmente fora o que acontecera.

No dia seguinte, logo após o almoço eu voltei para meu cantinho, com novos livros que havia comprado naquela manhã e alguns sanduíches que havia feito. Assim que entrei na sala empoeirada e cheia de objetos cobertos por lençóis me deparei novamente com o vulto na janela.

Isso aconteceu ao longo de toda a semana, de todo o mês e quase um ano depois, em uma manhã chuvosa, soube que meu vizinho morrera em um acidente de carro.

Entristeci-me sinceramente, estava acostumada à sua presença todos os dias nas janelas, às vezes acabava lendo um pouco mais alto do que costumava apenas para que ele ouvisse também. Não sabia se ele gostava do que ouvia, mas como todos os dias estava lá eu passei a me esforçar em minhas interpretações e às vezes até fazia perguntas, para as quais eu nunca ouvia uma resposta, mas nunca me sentia triste com isso.

Desanimada, fui para meu canto preferido da casa mas assim que encostei meus dedos na maçaneta dourada da porta desisti. Meus momentos de leitura que tanto me agradavam agora tinha perdido seu expectador e sua graça.

Passei um mês inteiro sem abrir aquela porta até que por fim o lançamento de uma nova história me cativou e como eu não poderia imaginar outro lugar para ler corri para a sala dos fantasmas e ao abrir a porta eu simplesmente congelei. Na janela, lá estava o vulto de meu vizinho fazendo sua sombra sobre as cortinas.

Pisquei diversas vezes, sentindo minhas mãos suarem enquanto o sangue parecia bombear em meus ouvidos.

Olhei para trás, para o corredor vazio e então tornei a olhar à janela. Imóvel, o vulto continuava em seu mesmo lugar, assim como eu.

Num impulso de coragem dei um passo para dentro da sala e então mais um e depois mais um, até me aproximar. Pensei em me sentar e ignorar aquilo, mas não conseguia. Meu medo e minha curiosidade cresciam a cada segundo enquanto em encarava as pesadas cortinas cerradas e o vulto por trás delas. Por todo aquele ano eu sequer havia visto seu rosto, ouvido sua voz. Para mim, nossas tardes onde eu lia deveriam ser mantidas em segredo, porque todos julgariam estranho eu passar a tarde toda com um desconhecido, contando-lhe histórias.

- O que está fazendo? - a voz da minha mãe às minhas costas me fez dar um salto e quando me virei deveria estar mais pálida do que qualquer fantasma de qualquer história de terror que já lera - Está pálida, não deveria ficar o dia todo nessa sala sem sol! - ela exclamou, aproximando-se de mim e da janela, puxando então as pesadas cortinas para o lado.

- Não! - eu gritei e derrubei meu livro no chão, jogando-me sobre mamãe como se fosse salvá-la de uma bala perdida, ela com certeza não estava vendo o vulto ali!

- Você enlouqueceu? - ela me perguntou, olhando então para a janela e rindo em seguida - O que? Vai me dizer que está com medo disso? - ela apontou e temerosa eu segui sua indicação.

Sim, lá estava ele, mas ao contrário do que pensei ele estava de costas.

Separei-me dos braços de mamãe e então me aproximei do vidro da janela, observando suas formas tão perfeitas molhadas pelo orvalho da manhã, sua superfície coberta pelo musgo esverdeado e por presentinhos que os passarinhos haviam deixado.

- ... - mal consegui responder mamãe, apenas encarando a estátua que ficava próximo à janela, formando o vulto agora no chão de madeira empoeirado.

Por quase um ano eu achara que estava conversando com alguém, dera vida àquela estátua e agora que descobrira a verdade me sentia perdida.

Milhares de coisas passaram por minha cabeça naquele momento, mas mesmo em minha infância, eu nunca pensei que havia perdido tempo com aquilo, com aquela amizade construída com o que para minha mãe era provavelmente um pedaço de pedra.

Sem hesitar, sai correndo da sala com meu livro em mãos e atravessei meu jardim, passando pelo vão da cerca que delimitava nosso terreno e parando quando alcancei o jardim vizinho.

Respeitosamente olhei em direção à casa, como se pedisse permissão e logo em seguida dei a volta para alcançar a parte detrás do jardim, onde estava a estátua.

Encarei seus olhos vazios por alguns segundos e então sorri, sentando-me diante dele e começando minha leitura.

É impressionante eu sei e até um pouco difícil de imaginar, mas agora aquela criação de pedra imóvel era meu melhor amigo e sem reclamar emprestou-me seus ouvidos por um longo tempo.

Tirei muitas lições que não julgo necessário relatar aqui, mas é claro que dentre todas essas lições sempre houve uma pergunta da qual nunca tive resposta. Quem ele era? Quem fora meu vizinho? Desde sua morte a casa permaneceu e permanece vazia. Será que ele também teria me ouvido? Será que ele também teria lido comigo?

Um comentário:

  1. Oi! Eu comprei o seu livro e fiz uma resenha.

    Link da Resenha: http://catalinaterrassa.blogspot.com/2012/03/resenha-neverdending-shadows-lana-lewis.html

    Espero que você goste.
    Parabéns pelo livro.
    Tchau! Beijos!

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